terça-feira, 18 de outubro de 2016

Flamengo, o principal adversário da CBF de Del Nero.

A reta final do Brasileiro tem exposto uma disputa fora de campo entre duas forças que se opõem radicalmente – de um lado, Marco Polo Del Nero, presidente da CBF, indiciado pela Justiça dos EUA por crimes de corrupção e que não viaja para o exterior com receio de ser preso; do outro, Eduardo Bandeira de Mello, presidente do clube de maior torcida do País e responsável direto pelo saneamento financeiro do Flamengo. Com o poder do futebol nacional em suas mãos, Del Nero leva vantagem no confronto.

Se continuar na CBF até o fim do seu mandato, em 2019 – hipótese pouco provável -, Del Nero vai querer a reeleição e tentará administrar a resistência de muitos clubes das Séries A e B do Brasileiro que têm visto em Bandeira de Mello uma liderança emergente.

Já submerso numa crise que impede a transferência de US$ 100 milhões da Fifa para a CBF, porque a entidade máxima do futebol suspeita da gestão da confederação, Del Nero sofreria um desgaste político mais acentuado ainda se visse o Flamengo de Eduardo Bandeira de Mello conquistar o Brasileiro de 2016.

Por isso, Del Nero, cujo coração pulsa pelo Verdão, não esconde sua torcida contra o Flamengo entre seus auxiliares mais próximos.

Talvez por coincidência, a CBF tenha vetado recentemente a venda de mando de campo nas rodadas finais do Brasileiro. Isso foi feito dias depois de o América-MG ‘vender’ o local de seu jogo com o Palmeiras - de Belo Horizonte para Londrina, cidade em que a torcida palmeirense é imensa. O Flamengo reclamou, mas não passou disso e vai ter de enfrentar o América na capital mineira em 16 de novembro.

Agora, o Rubro-Negro se vê diante de outra controvérsia, provocada pelo árbitro Sandro Ricci no jogo em que venceu o Fluminense por 2 a 1, em 13 de outubro, em Volta Redonda (RJ). O gol anulado de Henrique, que seria o do 2 a 2 e que estava realmente em impedimento, virou alvo de investigação pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) por causa de suposta interferência externa que teria levado Ricci a invalidar o lance.

Até aí, flamenguistas e tricolores podem apresentar argumentos cada qual em defesa de seu clube e isso não vem ao caso. O que é de se estranhar, no entanto, é a reação do presidente do STJD, Ronaldo Botelho Piacente, que declarou serem robustas as evidências de interferência externa na decisão de Ricci. Ao se manifestar dessa forma, Piacente praticamente já antecipou a votação do tribunal – ou seja, o jogo deverá ser anulado.

“Mais prudente seria que ele tivesse ficado em silêncio e deixado a procuradoria do STJD se manifestar”, disse ao Terra um especialista em direito esportivo e figura presente quase toda semana no plenário do STJD para defender clubes de todo o país.

O presidente do STJD ocupa o posto desde 14 de julho e só chegou lá graças à interferência externa de Del Nero, que foi seu cabo eleitoral número 1 em eleição realizada entre os nove auditores de última instância do tribunal. Piacente havia sido presidente do TJD-SP quando Del Nero dirigia a federação paulista. Os dois são aliados antigos e trabalham em conjunto.

Não é preciso ir longe para saber como começaram as rusgas entre Del Nero e Bandeira de Mello. A Primeira Liga, cada vez mais viva no cenário nacional, só se manteve até agora em razão do esforço do presidente do Flamengo. Ele apagou incêndio que se anunciava devastador, meses atrás, quando Gilvan Tavares jogou a toalha e anunciou sua saída da presidência da Liga, por razões políticas. Bandeira de Mello o convenceu a voltar atrás.

A saída de Gilvan, naquele momento, provocaria uma ruptura que provavelmente esfacelaria o movimento de clubes. Enquanto a Primeira Liga tentava se impor, a CBF de Del Nero fazia de tudo para boicotá-la. Esse desencontro permanece até hoje, tanto que a Liga não é reconhecida oficialmente pela CBF.

O dirigente da confederação teme que uma liga nacional de clubes esteja sendo semeada por Flamengo e outros grandes do Sul e Sudeste do Brasil. E nada indica que ele vá diminuir sua disposição de tomar medidas contrárias à Primeira Liga.

Além dessas questões, há uma outra que também deixa clara a oposição entre Del Nero e Bandeira de Mello. O presidente do Flamengo está à frente de um grupo de grandes clubes que ameaçam ir à Justiça para obrigar a CBF a cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte, que determina a participação dos clubes das Séries A e B nas assembleias eletivas da confederação.

Del Nero e seu grupo não admitem isso e tentam, em conversas reservadas com um e outro presidente de clube, dissuadi-los de recorrer à Justiça.

Convicto de que o sucesso do Rubro-Negro representa uma ameaça ao seu projeto de poder na CBF, Del Nero tentou em vão uma aproximação com Bandeira de Mello. Convidou o desafeto para ser o chefe da delegação do Brasil na Copa América Centenário, em junho, nos EUA – competição em que a Seleção foi eliminada na primeira fase.

O dirigente do Flamengo aceitou a honraria, em nome de seu clube, mas voltou atrás dias depois por causa dos maus resultados do time no início do Brasileiro – havia pressão interna para que não se ausentasse da Gávea. Como Del Nero não ousaria viajar para o país no qual é denunciado por corrupção, substituiu Bandeira pelo coronel Antônio Nunes, um dos vices da confederação.

Bandeira de Mello já tinha ‘dado o bolo’ em Del Nero numa outra oportunidade. Mas daquela vez em conjunto com presidentes de outros grandes clubes. Foi em outubro do ano passado, quando o presidente da CBF recebeu os integrantes da Primeira Liga para uma reunião seguida de almoço na sede da entidade. Os convidados participaram da primeira parte do encontro e recusaram a refeição, num claro recado a Del Nero.

Silvio Barsetti

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